sexta-feira, 14 de dezembro de 2012
Aprendendo com as Celebridades
Capítulo I
Pensando a Crise
“Nunca se deve deixar prosseguir uma crise para escapar de uma guerra, mesmo porque dela não se foje, mas apenas se adia para desvantagem própria” Maquiavel in O Príncipe
Em meados da década de 80, com aproximadamente 42 anos, eu freqüentava uma Igreja Evangélica Tradicional, de denominação Batista, quando o pastor me procurou solicitando para realizar uma palestra sobre a Crise da Meia Idade, dirigida para as pessoas que congregavam na nossa igreja e convidados. Presenteou-me com um livro chamado “O Cristão na meia Idade”, para leitura e reflexão.
Observei que este significativo período era marcado por diversas crises, que acometiam homens e mulheres de forma diferente. Preparei-me convenientemente e durante anos fui convidado a apresentar esta palestra em diferentes locais, para diferentes pessoas.
Ao iniciar a palestra, eu projetava o significado da palavra “crise”, como um dístico que representa “perigo” e ao mesmo tempo “oportunidade”.
A palavra crise significa “julgamento”, “decisão”, “falta de alguma coisa em vasta escala”, “período difícil na vida de uma pessoa ou de uma sociedade de cuja solução depende a volta a um estado normal”. É considerado um momento importante, que deve ser conhecido e valorizado, fundamentado na necessidade de buscar- se uma solução, pois, exige uma resolução eficiente e rápida. Toda crise exige um conjunto de ações.
Pois como disse Dante Aligueri na Divina Comédia “No inferno os lugares mais quente são reservados àqueles que escolheram a neutralidade em tempo de crise”.
É um período difícil, com inquietações, com desconfortos orgânicos e emocionais, que exige realizarmos as melhores escolhas, sem as quais nada irá melhorar, podendo inclusive agravar a crise e tornar muito mais difícil as mudanças desejáveis, aquelas que esperamos ser eficazes em função do momento e suas circunstâncias.
As decisões sempre serão políticas, considerando que o homem é um ser essencialmente político. É fundamental buscarmos a estabilização de todo sistema, principalmente o financeiro e o ecológico.
A situação atual no mundo nos possibilita materializar a reflexão, percebendo as dramáticas conseqüências sociais.
É preciso interferir para mudarmos adequadamente as regras do jogo financeiro e os hábitos de consumo. Precisamos ter o conhecimento da realidade e a vontade de realizar as mudanças e, esta disponibilidade deve ser voluntária e consciente.
Nos dias de hoje e cada vez mais, o estilo de vida das pessoas está baseado no crescimento constante do consumo, estamos preocupados em revelarmos um mundo de realizações e satisfações muito além do que podemos, onde o “aparentar ser” é mais importante do que “ser efetivamente”.
O que nos impulsiona para a vida e desenvolve o progresso é a necessidade e concretização do consumo, parecendo mais estar vivo quem mais consome.
Observamos com um olhar histórico, que este paradigma tem-se mantido através dos tempos e sociedades, o que permitiu a Sólon, no Século VI A.C. dizer um sentimento atual: “Quanto à riqueza, não há limite claramente definido. Pois aqueles que hoje dispõem das maiores fortunas entre nós possuem também o dobro da voracidade dos demais, e quem poderá satisfazer a todos?”
Um Século depois Sófocles disse: “Nada suscitou nos homens tantas ignomínias como o dinheiro. É capaz de arruinar cidades, de expulsar os homens de seus lares; seduz e deturpa o espírito nobre dos justos, levando-os a ações abomináveis. Ensina ao mortal os caminhos da astúcia e da perfídia, e o induz a realizar obras amaldiçoadas por deuses.”
No Século II A.C. Cícero afirmou: “Estar satisfeito com a nossa própria riqueza é a maior e mais segura riqueza....”. Isto nos parece irreal.
Somos influenciados por diferentes agentes publicitários, econômicos e ideológicos, afirmando eles que o progresso está no possuir mais, assim como o sucesso e a felicidade também, nos influenciando concluir que está mais realizado quem mais possui. Como se a “liberdade” e o “bem estar”, elementos estruturais na construção de um estilo de vida com mais prazer e menos conflitos, dependesse exclusivamente da condição da posse de bens, duráveis ou não.
Não podemos nos colocar contra os prazeres materiais, eles são reais e também positivos, mas temos que estabelecer limites para o consumo, considerando sempre o necessário e o possível.
É sábio elegermos um modelo ideal de vida, de forma prudente, entendendo que o modelo que faz da posse (desnecessária), da acumulação (sem limites racionais) e da troca constante (por ostentação), não pode ser o melhor para as pessoas e não garantem uma vida de realizações, pois estes não se harmonizam com o sentido maior da existência humana; são apenas prazeres ocasionais.
Temos que facilitar a nossa adptação diante da realidade, conforme as diferentes situações possíveis; é impossível termos uma vida linear, só de prazeres, sem nenhuma dificuldade e transtornos... quem brinca só de rainha pode se acostumar com a fantasia.
É bom lembrar que os recursos naturais e os monetários não são garantias eternas, podendo faltar um dia e precisamos nos adaptar, com o mínimo de sofrimento, para viver sem eles ou com poucos recursos.
Nem todas as crises são reversíveis e sempre promovem efeitos negativos, independente do prazo de duração. Portanto, é bom refletir nas relações que envolvem a economia e a educação financeira, a sociedade ou grupo social, o real significado do dinheiro e sua utilização, o equilíbrio pessoal e familiar, e o estado de felicidade individual e a realização do coletivo.
Crise é isso, é perigo e oportunidades, é um importante aviso para promovermos mudanças. O homem é um ser em constante transformação. Crise não é só ruim, é um sinal para ser notado e valorizado, exige a participação de cada pessoa envolvida no processo, onde todos são responsáveis e cada um tem de contribuir de acordo com as necessidades do momento e suas possibilidades, para assim quando a situação melhorar todos possam se beneficiar das conquistas.
Todos sabemos que a vida não pode ser considerada apenas como “fazer dinheiro” e que o único prazer seja o “consumo”. Mas tem sido assim através dos tempos, como revelam as palavras de Weber em 1920 “O impulso para a aquisição, a busca do ganho, do dinheiro, da maior quantidade possível de dinheiro, não tem nada haver com o capitalismo. Tal impulso existe e tem existido entre garçons, médicos, artistas, cocheiros, prostitutas, funcionários desonestos, soldados, nobres, cruzados, apostadores e mendigos. Pode-se dizer que ele tem sido comum a todos os tipos de homens, de todas as condições, em todas as épocas e países do planeta, onde quer que a possibilidade objetiva dele exista ou tenha existido[.....] A auri sacra fames é tão antiga quanto a história do homem.
Cada pessoa deve promover na própria vida as mudanças que deseja para a sociedade. Pensar diferente e agir diferente, para sentir de modo diferente o mundo, este segue em frente, sem pedir autorização e passagem.
A mudança é singular, a educação é o meio, o tipo e forma é uma escolha pessoal.
As religiões e teorias filosóficas tentam fornecer respostas às perguntas que mais inquietam o ser humano, mas em vez de fazê-lo de maneira simples, disponibilizam mais regras e conceitos, nem sempre de fácil avaliação e execução.
O maior número de conflitos e violências existentes nos dias de hoje, são influenciados pelas religiões e crenças que interferem no comportamento das pessoas, possibilitando-nos acreditar na impossibilidade de reconciliação entre os humanos, não parecendo ser possível viver em paz, pelo menos neste mundo.
Cada um necessita questionar mais, e procurar com esforços próprios as respostas coerentes sobre o estado de felicidade e sua possibilidade de conquista; sobre as virtudes e como elas interferem positivamente no bem estar das pessoas; numa vida justa e harmônica em benefício do coletivo; a importância da natureza e os benefícios do natural. Não existe um espaço formal e nem organização confiável que se disponha discutir sobre a arte de viver, é tudo um faz de conta que....
Não temos interesse e nem vontade de nos aprimorarmos, nos transformando com uma boa leitura e contemplação da arte. A beleza e o encanto das palavras proferidas com sabedoria não nos emocionam e perdemos muito com isso. O prazer tem que ser imediato, advindo preferencialmente de manifestação física.
“Aquilo que o homem atual típico deseja conseguir com o dinheiro é mais dinheiro. Com o objetivo de ostentar e sobrepujar àqueles que eram então seus iguais [.....], Mais que isso: fez-se do dinheiro a medida aceita da inteligência. Aquele que ganha muito é esperto; aquele que não, não é. Ninguém gosta de ser visto como um tolo” Bertrand Russel (1930).
Temos que responder, conscientemente, algumas perguntas:
Quem tem sido os nossos mestres?
O ser humano pode viver livremente, como um indivíduo autônomo, sendo responsável pelas suas escolhas e ações, agindo com tolerância em suas decisões em favor do grupo social para viver em harmonia com os outros, numa sociedade construída em torno do ideal de TER ?
Somos capazes de entender que o dinheiro para a aquisição de bens materiais não é um fim, que é apenas um meio, mesmo que muito importante?
Somos capazes de concordar que o desejo de posse é naturalmente insaciável? Que a falta de algum bem, mesmo que não essencial, pode provocar frustração e violência, tanto que algumas pessoas à tomam a força?
Nietzsche em 1882 disse: “A mais diligente das épocas...a nossa...não sabe o que fazer com a sua deligência e seu dinheiro, exceto cada vez mais dinheiro e mais deligência: é preciso mais gênio para gastar do que para adquirir! – Bem, nós teremos os nossos “netos”!”.
A Pirâmide de Maslow revela as necessidades humanas e as hierarquiza. TEMOS necessidades materiais básicas, como alimentação, moradia e como vivermos descentemente. Posteriormente, o homem deixa de ter essas necessidades comuns a todos os seres vivos, se distinguindo dos demais, pois surge um novo paradigma para sentir-se realizado e humano: a do SER. Este processo inicia-se pelo autoconhecimento para posterior aceitação; a pessoa precisa ainda aprender para se transformar, este é um processo, como já dissemos, de humanização, que nunca mais termina e exige compreender o outro para respeitar as relações. Se as necessidades básicas são a base da piramide, a busca e a realização do aprimoramento, como vocação, missão e a conquista dos desejos, são o ápice desta pirâmide.
Com os sábios podemos aprender a arte em bem viver, que pressupõem amar, exorcizar os medos, administrar as frustrações, superar as dificuldades, aprender as virtudes, lidar com a sexualidade, a organização do trabalho e lidar com a morte como um evento natural.
As pessoas com quem mais aprendi, foram aquelas que mesmo não deixando nada escrito, seus ensinamentos se reproduziram em outras pessoas de forma viva e chegaram até nós: Jesus, Sócrates e outros filósofos gregos, as escrituras e àquelas que vivem de forma minemalista. Os verdadeiros heróis falam com a razão e conseguem chegar ao coração, viveram pensando no bem comum. Eles se opõem ao que vivemos hoje, um mix mal dosado, com ações mercantilistas e materialistas, um fanatismo religioso e dogmático.
“Natura simplicitatem amat (a natureza ama a simplicidade) Kepler (1619).
Penso numa reconstrução pessoal, onde existe o TER e o SER, conforme a necessidade do momento e circunstâncias. Que o exemplo seja capaz de influenciar outras pessoas com atitudes sinceras; diferente da lógica praticada nas sociedades comuns, que nos conduz a uma crise de dimensões desconhecidas, pois elas mantém apenas o paradigma do TER, com poderes hipnóticos, produzindo pessoas obedientes ao sistema político, financeiro, ideológico e religioso.
Lucrécio, no Século I A.C. , disse: “ Quando surgiu a propriedade e o ouro foi descoberto, a força e a beleza perderam muito do seu brilho. Pois não importa quão belo ou fortes sejam os homens, eles em geral seguem atrás do mais rico”.
Independente do como se tornou rico, sobre isso falaram:
Horácio (Século I A.C.) “Por meios honestos se você conseguir, mas por quaisquer meios faça dinheiro”.
Juvenal (Século I A.C.) “ Quem liga para a reputação se consegue agarrar o seu dinheiro?”.
“ É o amor ao dinheiro que causou esta transformação. Nos tempos antigos, quando se sabia apreciar a virtude por si mesma, as artes liberais e a ciência floresciam, e uma nobre emulação levava os homens a darem o melhor de si na busca de descobertas que beneficiariam os séculos vindouros........”. Petrônio (Século I D.C.).
Na relação com o dinheiro é preciso considerar dois acontecimentos importantes, “como ganhar” e “como utilizar”. O problema não está no dinheiro e sim na forma do como nos relacionamos com ele. É ótimo ter dinheiro, para comprar o que necessitamos e sabiamente desejamos, mas principalmente para não ter que pensar nele o tempo todo.
“Não cabe admitir mais causa para as ocorrências naturais do que aquelas que são a um só tempo verdadeiras e suficientes para explicar seus fenômenos. É com esse intuito que os filósofos dizem que a natureza nada faz em vão [....], pois a natureza se apraz com a simplicidade e não com a pompa de causas supérfluas” Newton (1687).
Quando perguntaram a Sócrates: entre os homens mortais qual poderia ser considerado o mais próximo dos deuses em felicidade? Ele respondeu: aquele homem que carece de menos coisas.
Somos reféns do desejo e, como simples aprendizes é bom nos eduacarmos, para limitarmos os nossos desejos ao universo de possibilidades, e ao conquistarmos também descobrir e revelar a importância do que esta conquista nos representa, no “quem” conseguimos nos tornar nesta relação, para celebrar a conquista do desejo e sentir o prazer que a vida nos proporciona.
Temos que modificar o “sentimento” das afirmações contidas nas palavras de Aristóteles que disse “aquilo que os homens carecem é o que mais desejam” e, de Machado de Assis que sugere uma reflexão para tomarmos uma atitude de negação à frase: “o melhor dos bens é o que não se possui”.
Cuidado: o mais presente em nós é o que nos falta e não o que temos.
TER e SER constituem a natureza humana, o COMO é o que nos personaliza.
As pessoas estão submetidas aos mesmos fatos, mudando apenas a forma de como se relacionar com eles.
“Se voce deseja uma descrição de nossa era, eis aqui uma: a civilização dos meios sem os fins; opulenta em meios para além de qualquer outra época, e quase para além das necessidades humanas, mas esbanjando-os e utilizando-os mal porque não possui nenhum ideal soberano; um vasto corpo com uma alma esquálida” R.W. Livingstone (1945).
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