quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
Capítulo IV
Pensando o prazer
“Não importa o que digam os relógios ou as atitudes e labores dos homens. De manhã é quando estou desperto e há uma alvorada em mim. A reforma moral é o esforço de se desvencilhar do sono. Por que razão dão aos homens um balanço tão pobre do seu dia, senão pelo fato de que estiveram atordoados pelo sono? Eles não são tão mal calculadores assim. Se não estivessem tomados pela sonolência, eles teriam realizado algo. Os milhões estão suficientemente despertos para o trabalho físico; mas somente um em um milhão está desperto o suficiente para um trabalho intelectual efetivo, e só um em cem milhões para a vida poética e divina. Estar desperto é estar vivo. Nunca até hoje encontrei um homem desperto o suficiente. Como eu poderia olhá-lo de frente? [...] Afetar a qualidade do dia, eis a mais elevada das artes. Todo homem recebe a tarefa de tornar a sua vida, até mesmo nos seus detalhes, digna da contemplação de sua hora mais crítica e elevada” - Henry Thoreau (1854).
Manter uma rotina diária de atividades parece ser menos cansativo, até mais produtivo, mas, ao longo da vida ela é a principal causa de perda da energia vital, tornando-nos preguiçosos e tristes.
A vida obriga-nos estabelecer e rever as prioridades, conforme as circunstâncias, pois elas são determinantes na administração das nossas atitudes. Podemos fazer as circunstâncias e suas consequências, como apenas sobreviver àquelas que surgem ou disponibilizam para nós.
A força motora na existência humana é a busca constante do prazer. Uma mente sadia não se contenta com o sofrimento e nem com o prazer eventual. O prazer é um estado agradável, é uma sensação cuja obtenção depende do resultado de ações provocadas conscientemente, raras vezes são ocasionais.
Baudelaire (1869), faz referência que é importante a vontade desafiadora de todos os dias em nos tornarmos uma pessoa melhor. Diz ainda: “Sonhos! sempre sonhos! E quanto mais ambiciosa e fina é a alma, tanto mais os sonhos a afastam do possível. Cada homem traz em si sua dose de ópio natural, constantemente sagrada e renovada. E, do nascimento à morte, quantas horas poderemos contar preenchidas pelo verdadeiro prazer, pela ação feliz e resoluta?”. Significa que a conquista do prazer não é fácil e nem duradoura, mas sempre compensadora.
Mozart (1777) disse que a felicidade existe apenas na imaginação.
Se considerarmos a felicidade como um “produto acabado” creio que sim. Lembro de uma condição interessante, que se assemelha e se aplica ao fato: uma tarde estava na casa da namorada, quando começamos a nos abraçar, trocar afetos, nos acariciar com beijos, quando disse que o que mais queria naquele momento era fazer amor com ela, e ela simplesmente disse o óbvio, mas, nós já estamos fazendo amor, este não depende apenas da penetração. O prazer não pode estar atribuído somente ao orgasmo, mesmo porque seria por muito pouco tempo, ele é fugaz.
Temos que reconhecer a importância de cada fase do processo e nos beneficiarmos dele, valorizando-o como o meio de conquista do prazer.
“Não são as coisas em si mesmas que perturbam (ou dão prazer) aos homens, mas os juízos que eles fazem sobre as coisas” – Epiteo (Século I A.C.).
Nem sempre as circunstâncias são favoráveis para a obtenção do prazer e, para a efetivação da alegria não podemos desistir diante das primeiras dificuldades (que parecem ser maiores do que reais); necessitamos nos superar, ir além dos próprios e imaginários limites, sem abandonar o projeto de conquista, para desfrutarmos das consequências da liberdade e do bem-estar, elementos essenciais do prazer.
“Quem quer que faça o melhor que as suas circunstâncias permitem age bem, age com nobreza: os anjos não fariam melhor” – Edward Young (1745).
A lembrança histórica sobre os desejos humanos, tem sido traduzido com a uma palavra simples “felicidade”, mas de complexo entendimento e difícil obtenção.
Felicidade, o prazer sem conflitos, é como educação, não se estuda, se discute, se reflete, se aplica conforme as circunstâncias. Como educação, a felicidade é a busca constante pela transformação da realidade.
O desejo de todo ser vivo é o sentir-se livre. Esta é a principal ação transformadora da educação, possibilitar que as pessoas se libertem...DE alguma coisa...PARA alguma coisa.
O destino do “homem que sabe”, é viver num processo de constantes transformações, algumas deliberadamente escolhidas, como no auto-erotismo, e outras oferecidas pelo próprio processo da vida como produto das relações e, interpretá-las conforme as suas sensações.
“O bem e o mal, tanto o natural como o moral, são inteiramente relativos ao sentimento e afeição dos humanos. Nenhum homem jamais seria infeliz se pudesse alterar os seus sentimentos”– David Hume (1742).
Discutir o prazer é antes de tudo, refletir sobre o que, efetivamente, é importante na vida de cada um, sendo portanto uma condição singular.
Se o destino na vida é o caminho, torna-se necessário ponderarmos os méritos relativos e as conseqüências dos diferentes caminhos, como também as condições orgânicas, materiais e emocionais do caminhante. Somos livres para realizarmos escolhas e reféns de suas consequências.
Com as palavras de Paulo em 1 Coríntios, 6:12 “Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm [...]”, é possível afirmar que diante de um universo de possibilidades, temos enorme dificuldades em saber, à luz da razão e da realidade, quais as escolhas que poderão representar as melhores possibilidades na obtenção do prazer sem dolo. A liberdade nos possibilita realizar o que desejamos, mas, o bom senso determina as consequências para realizarmos a melhor escolha. Liberdade e Responsabilidade tornam-se as duas faces da mesma moeda.
Ser ou não ser, fazer ou não fazer, ir ou não ir, dizer ou ficar calado... eis uma eterna questão de inquietações.
Nietzsche (1881) disse: “Foram as coisas reais ou imaginadas que mais contribuíram para a felicidade humana? É certo que a amplidão do espaço entre a suprema felicidade e a mais profunda infelicidade foi criada apenas com o auxílio das coisas imaginadas. Esse tipo de sentimento do espaço, então, é reduzido cada vez mais pela ação da ciência: de modo que dela prendemos a perecer a Terra como pequena, e o próprio sistema solar como simples ponto”.
Como a vida nos obriga realizar escolhas, para não ficarmos à margem no caminho temos que responder à algumas perguntas.
As nossas escolhas têm conseguido traduzir em prazer as nossas realizações?
Temos realizados as melhores escolhas conforme as circunstâncias? Até que ponto, as nossas escolhas favorecem a possibilidade de ocorrer eventos que possibilitam nos mantermos livres e, promovermos o bem-estar? Temos nos beneficiado dos acertos e erros, como lição para realizarmos ajustes e correções? A civilização entristece o animal humano, preferindo o convívio com outros animais? Prazer, bem estar, liberdade consciente para inventar um estilo de vida, qualidade de vida pessoal e profissional são possíveis? O novo conhecer pode modificar o entendimento do conhecido, como a nova forma de viver compreender o que foi vivido? Não podemos mudar os “fatos“, podemos mudar as “sensações” que os fatos produzem, tornando-as mais leves.
A vida é um processo constante de novos nascimentos, como disse Erich Fromm (psicanalista, filósofo e sociólogo, que viveu entre 1900 e 1980). Começar de novo ou recomeçar, não é voltar para trás para refazer, começando tudo de novo (isto é impossível). É fazer melhor daqui para frente, fazendo escolhas mais eficientes e realizando os procedimentos com mais eficácia.
Há tempos e situações em que é preciso corrigir a rota, nos aparelharmos estrategicamente, iluminarmos o caminho para não perdermos a direção e, conquistarmos os objetivos. Este é o feedback para elaborarmos novas metas: planejamento, organização, coordenação, direção e avaliação dos resultados. É preciso seguir em frente, minimizando e até eliminando algumas possibilidades de praticas equivocadas.
Voltar atrás é experimentar uma liberdade consciente e madura, significa não ter nenhum compromisso com o erro. É possibilitar, ideologicamente, voltarmos ao ponto de partida, onde tínhamos apenas a necessidade estética em saber e agora descobrindo o prazer oculto no “sabor em saber”.
Considerando que é mais presente no ser humano o que nos falta e não o que temos e podemos, as palavras de Sócrates ao dizer que o homem é um ser eternamente insatisfeito, nos convida permanecer atentos para valorizarmos o que temos e somos, sem lamentações desnecessárias.
Kant (1789) disse: “Dê tudo que um homem deseja, e ele, apesar disso, naquele mesmo momento, sentirá que este tudo não é tudo”.
“[...] Todas as coisas que são, são com mais ímpeto perseguidas do que desfrutadas” – Shakespeare (1600).
Pensar o prazer é complexo, necessitando constantes reflexões, em busca de informações e melhor esclarecimento, para experimentarmos diferentes e agradáveis sensações.
Um provérbio árabe diz: “nós rezamos pela subida do Nilo. O Nilo subiu, e fomos devastados pela inundação”.
Oscar Wilde (1895) disse: “Quando os deuses querem nos punir, eles atendem às nossas preces”.
Condição semelhante diz mais tarde Bernard Shaw (1903): “Existem duas tragédias na vida. Uma é não conquistar o que o seu coração deseja.A outra é conquistar”.
Assim tem sido uma constante na vida dos desatentos: o comportamento humano nos dias atuais revelam que o progresso técnico e o aumento dos níveis da produtividade, renda e consumo, são insuficientes para o aprimoramento ético e político das pessoas, mas, o desejo pela obtenção do prazer imediato aumenta de maneira rápida e significativa, gerando mais ansiedade.
O fato é que temos nos preocupado com o aspecto de modernidade das fachadas dos templos, físicos e humanos, e não com os seus alicerces. Neste aspecto, um significativo exemplo nos é proporcionado por Sidarta, que renuncia à uma vida de prazeres afeiçoados apenas ao material, para descobrir uma outra vida, mais rica, como Buda, no despertar interior.
O prazer representa uma necessidade que deve ser conquistada, e neste desafio natural temos que nos aplicar: com sabedoria (para sabermos “o que” devemos fazer), com habilidade (é o “como” fazer para fazermos bem feito) e com virtude (o “fazer” com vontade).
Ao concluir, uma excelente reflexão nos possibilita Jhon Stuart Mill (1863): “Uma condição de exaltado prazer somente se mantém por momentos ou, em alguns casos, e com algumas interrupções, por horas ou dias. Ela é o brilhante clarão ocasional da alegria, e não a sua chama firme e constante. Disto sempre estiveram tão cientes os filósofos que ensinaram ser a felicidade a finalidade da vida como aqueles que a eles se opuseram. A felicidade que concebiam não era a do arrebatamento, mas de momentos assim em meio a uma existência constituída de poucas e transitórias dores, muitos e variados prazeres, com um predomínio decidido do componente ativo sobre o passivo, e tendo como fundamento do todo não esperar da vida mais do que ela é capaz de oferecer. Uma vida assim constituída, para aqueles a boa fortuna em obtê-la, sempre pareceu merecedora da designação de feliz. E uma existência assim, é mesmo hoje em dia, o destino de muitos durante uma parte considerável de suas vidas. A educação falida e os arranjos sociais falidos são os únicos obstáculos reais que impedem que isso esteja ao alcance quase de todos”.
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