Como me vejo diante do espelho da vida?
Um ser mutável, várias pessoas compondo uma unidade. Corpo e mente são aspectos diferentes da mesma pessoa.
Sou revelado ao mundo como um templo envelhecido, em desconstrução. As vezes me considero com uma inteligência equivocada, conseqüência de esquecimentos naturais.
Meu cotidiano é uma rotina, de hábitos previsíveis, com duplo olhar: uma visão de decepção (repentina) por não viver conforme planejado; e outra visão de gratidão, direcionada às realizações (com significativas conquistas).
Me emociono com o menino que fui, convivendo com a família e muitos amigos, num universo com alma feminina, acolhedor (elas são o máximo).
Sou ainda um pouco do que sempre fui, um adolescente com “asas” e “patins“, para estar em vários lugares quase ao mesmo tempo; com um coração vibrante, para amar e ser amado.
Ontem estive comigo mesmo, como universitário, inquieto e sonhador, construindo uma identidade profissional. O principal objetivo é prestar serviços e merecer dinheiro para financiar a vida em família. Sempre com a mulher amada.
Como o tempo passa muito depressa, logo me vi adulto. O coração saltou nas lembranças, de mãos dadas com as pessoas e com o meu mundo. Minha companhia e companheira, meus alunos, meus pacientes e meus filhos, ainda são o meu gueto. Sempre que eles fecham os olhos, eu feliz adormeço.
Vejo também uma pessoa singular, complexa e empreendedora, construindo um lugar seguro, harmonioso e feliz para abrigar aqueles que queria proteger, e, colaborando para que outros construíssem o seu próprio mundo, conforme as suas escolhas.
Converso com o pai que me tornei um dia e viu seus filhos crescerem, como os seus alunos, e irem embora para construírem a sua vida, conforme escolhas e possibilidades. Orando por eles.
Contemplo a natureza, a sua beleza. Penso que as vezes é mais cruel do que a sociedade. Aonde estão os amores que idealizei? Se foram com o tempo, como o meu corpo e os meus atrativos. Juventude, beleza e entusiasmo andam juntos.
Sou filho do tempo; neste ser que ele transformou habitam muitas pessoas. Houve tempo que uns choraram e outros riram, que uns sublimaram e outros conquistaram, gosto de todas as pessoas que fui e a que agora sou (a somatória de todas as outras). O tempo também é um aliado, permitiu-me esquecer (na maior quantidade das horas) das dificuldades e me lembrar das superações.
Toda vez que visito as pessoas que fui no meu passado eu as compreendo, eu as respeito e as valorizo sempre mais. Abrigam o velho que consegui ser. O ancião e o jovem se suportam e se influenciam.
Agora me vejo olhando o infinito, para aceitar o que já aconteceu, os fatos que mais marcaram são inevitáveis. No espelho sempre observo: “eu” como resposta das circunstâncias. Um menino, um jovem, um adulto produtivo, um pai de família, um professor zeloso com seus alunos e a profissão , um profissional de realizações sociais e conquistas de homenagens (algumas obtive por merecimento, humildemente, dedico aos meus alunos; outras por favor), um idoso que clama por mais vida, desde que seja para estar colaborando, caso contrário não há mais sentido em viver. O homem nasceu para ser útil.
Contemplo a pessoa que sou e a que sempre considerou: “devemos viver para fazer algo de bom para as pessoas e pelo mundo“. A vida é processo, o trabalho é missão.
Quem eu vejo no espelho?
Uma pessoa marcada pelos seus sentimentos, um velho sereno. Vejo uma pessoa temporal, que aceita os limites. Capaz de vencer os monstros que habitam na cabeça de todas as pessoas, relacionadas aos medos e auto-estima. Sempre tive aonde colocar as minhas esperanças.
As experiências me marcaram, como o feitor marca o gado. Cada marca tem uma história e o desafio foi amenizá-las. Corpo, mente, prazer, ilusão, vontade, convicções...sempre caminharam juntos.
Não consigo esconder a idade, olhar os meus contemporâneos não permite; eles acusam o meu envelhecimento. Diferente do espelho que se acostumou com o meu rosto e feições, as diferenças não acontecem num mesmo dia.
O tempo me deu oportunidade de viver muito, me encantei com quase tudo. É descoberta, é aventura. Lágrimas e sorrisos sangram pela mesma ferida.
Admiro, ao olhar, a pessoa que vive em mim e descobriu que na vida devemos consumir a nossa energia procurando entender as sensações e fatos, e não apenas temê-los.
Toda vez que precisei de uma mão amiga, encontrei duas, no final dos meus braços. O homem é um ser solitário que pode contar com as suas próprias companhias.
Muitas vezes disse o que pensava, não fui oportuno e nem eficaz. Outras vezes pensei antes de dizer, disse francamente, fui eficiente, me senti melhor e possibilitei que os outros se sentissem melhor também. Não existe maior alegria do que promover a alegria do outro.
Quando deixar este mundo, não estarei só. Irei eu e todas as pessoas que existem em mim, juntas, de mãos dadas.
A morte é a condição que transforma todos na mesma substância, independente do que fomos ou julgamos ter sido: ricos ou pobres, doutores ou ignóbeis, feios ou bonitos.
Descubro que o mistério da morte é apenas deixar de viver. O que é imortal, princípios e valores, continuarão a viver com as pessoas que, efetivamente, respeitei e amei.
Este é o meu legado para os filhos do desejo, como eu, filho do tempo.
Que lindo!!! sempre, mas sempre sábio!!!!
ResponderExcluirSérgio... Mestre... "Master Mind"
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